Prof.
Clever Jatobá[1]
1.
CONSIDERAÇÕES
INICIAIS
Na clássica visão
aristotélica, o homem é um ser gregário, ou seja, para atender às suas próprias
necessidades, está propenso a viver em agrupamentos sociais. Ocorre, porém, que
a vida em sociedade não é uma tarefa simples, pois exige a imposição de limites
à liberdade individual, de modo a garantir que a convivência e as relações
interpessoais seja harmônicas. Deste contexto, surge, então, a figura do
Direito.
Ao bem da verdade, a palavra
“direito” pode ter várias conotações[2],
todavia, num sentido mais básico sob a ótica jurídica, este pode ser
compreendido como instrumento hábil à regulamentação da vida em sociedade, pois
será este o responsável pelas limitações das liberdades individuais, bem como
da sua própria garantia, assim, estabelece-se a máxima de que o direito de
alguém termina, quando começar o de outrem.
Com base nestas
premissas, ao regular a vida em sociedade, incumbe-se ao Direito a missão de se
preservar a harmônica convivência interpessoal e garantir o bem-estar social.
1.1.NOÇÕES
DE I.E.D. PARA COMPREENSÃO DO DIREITO
Diferentemente das
ciências exatas, onde a segurança dos seus dados estabelece uma resposta exata,
imutável e específica, o Direito como ciência social não se subsumi à tal
imutabilidade, pois apesar de estabelecer regras que limitam, proíbem ou
autorizam comportamentos humanos, caracteriza-se, essencialmente, pela
liberdade de escolha do agente em relação à sua conduta. Assim, diz-se que as ciências
exatas são ciências do “ser”, ao tempo em que a ciência do Direito é
iminentemente do “dever ser”.
Em meio a esta
realidade, o Direito como ciência social estabelece regras, norteadas por
princípios jurídicos, ou balizas morais, que devem ser cumpridas em sua
conformidade, mas que, diante da liberdade de escolha de cada sujeito, pode ser
violada por um comportamento diametralmente oposto à sua dicção.
O Direito como ciência
social concebe classificações variadas que ajudam a desenhar os seus contornos
e viabilizar a compreensão de várias das suas concepções. Assim, atendendo à
natureza propedêutica do estudo inicial do Direito, faremos uma breve e sucinta
distinção entre algumas destas acepções do “Direito” no seio do estudo da
ciência jurídica.
1.1.1
Direito,
Moral e Justiça
Quando se fala em
“direito”, no censo comum se pensa em algo correto, em agir em acordo com o que
está certo, seguindo preceitos próprios da distinção entre certo e errado.
Ocorre, porém, que
quando se fala em Direito sob a ótica jurídica encontra-se no inconsciente
coletivo a natural aproximação da sua compreensão com a ideia de justiça. Não
obstante o fato de ser muito comum se aproximar Direito de justiça, ambos não
se confundem. Direito é algo que regula as relações intersubjetivas
estabelecendo as regras de convívio social, ao tempo em que justiça é um ideal
que se desenha sob diretrizes axiológicas.
Por isso é que Alysson
Leandro Mascaro[3] esclarece
que a justiça “não é um dado objetivo, algo concreto ou palpável por si só: o justo
é uma relação, juma medida, uma proporção”.
Uma vez que não se
confundem, é natural que hajam situações que legalmente sejam de direito, mas
que nem sempre se amoldam ao que se espera da justiça.
Por sua vez, é comum
também se confundir as regras do Direito com as regras morais. Eis aqui mais um
equívoco... Ao bem da verdade, as normas morais e as normas jurídicas
estabelecem regras de comportamento, quais se distinguem no ponto da
possibilidade de se impor uma sanção como consequência da sua violação, bem
como da coercitividade de se exigir tal efeito. Neste contexto, ao tempo em que
quando violadas as normas jurídicas é possível se regular como efeito a
imposição de uma sanção, ou uma medida reparadora aplicada de forma coercitiva,
no caso da violação às regras morais, esta não se submete à uma sanção legal
como consequência, mas, apenas, à reprovação moral, da qual não se pode exigir
uma punição correspondente.
Malgrado o fato do
Direito não se confundir com a justiça, nem tampouco com a moral, além de
coexistirem diante da realidade social, eles podem conhecidir e se coadunarem
em uma mesma situação, sendo, esta, talvez, o ideal a se buscar concretizar. Cremos,
inclusive, que o Direito deve ser norteado por valores morais, éticos, e
essencialmente pelo censo de justiça, sob pena de perder sua essência e até a
sua razão de ser.
1.1.2.
Direito Positivo e Direito Natural
O ponto de partida da
Introdução ao Estudo do Direito (IED) repousa na clássica distinção entre o que
seria Direito Positivo e Direito Natural. Tal distinção, a propósito, norteia
os embates filosóficos das correntes Jusnaturalistas em detrimento da escola do
Positivismo Jurídico.
O Direito Positivo consiste
no direito vigente num determinado país em uma determinada época, posto pelo
Estado como instrumento de regulamentação da vida social, ou seja, é aquele
estabelecido por opção do legislador que (em tese) deve refletir a vontade do
povo e atender às necessidades e reclames sociais, de modo a preservar o
bem-estar das relações interpessoais.
Por sua vez, o Direito Natural
não é criado pelo Estado, nem tampouco pela sociedade, trata-se de um direito
espontâneo, que surge da própria natureza social do ser humano, que se revela
ao longo das experiências sociais pela ótica da razão.
Desta forma, podemos
dizer que o Direito Natural se figura como algo ideal, consubstanciando
princípios de caráter universal que antecedem ao Direito Positivo e lhe servem
de inspiração, de norte à busca do que é ideal à sociedade num dado momento.
1.1.3.
Direito Objetivo, Direito Subjetivo e Direito Potestativo
No que tange à
amplitude e alcance do direito, bem como à liberdade na escolha da conduta,
duas são as concepções do Direito, quais sejam: o Direito Objetivo e o Direito
Subjetivo.
Neste esteio, o Direito
Objetivo consiste no conjunto de normas jurídicas de caráter geral,
estabelecidas genericamente, com alcance erga
omnes, ou seja, que impõe a todos a sua observância. Por sua vez, o Direito
Subjetivo já consiste na faculdade que o titular de um determinado direito tem
de invoca-lo em seu favor, ou de agir em conformidade com o Direito Objetivo,
ou até de pleitear que este lhe seja garantido.
Por se tratar, o
Direito de ciência do “dever ser” e, assim, estar submetida à liberdade de
escolha do agente em relação à sua conduta, tal distinção vem elucidar a ideia
de que o Direito Objetivo estabelece genericamente as regras do convívio
social, ao tempo em que o direito Subjetivo submete tais regras ao livre
arbítrio do sujeito, qual pode escolher viver conforme o Direito, ou violá-lo,
bem como se submeter à violação, ou reclamar sua proteção.
Ainda sob a ótica da compreensão
desta amplitude da expressão “direito”, não se pode deixar de apreciar os
direitos potestativos, ou seja aquele que permite a um titular de um direito
interferir na esfera jurídica de outrem, sem que nada este outro possa fazer.
Neste caso, poderíamos exemplificar a situação de uma pessoa cancelar uma
procuração, ou de um empregador despedir o seu funcionário, ou até mesmo, de um
cônjuge requerer o divórcio e a dissolução do seu casamento. Tais situações
desenham a essência do direito potestativo.
1.1.4.
Direito Público e Direito Privado
Apesar de todas as
conotações ou desdobramentos que a “expressão” direito pode nos oferecer, como
ciência jurídica social, o Direito é uno e indivisível, de modo a garantir a
regulamentação da vida social. Assim, conceitos básicos, premissas e princípios
gerais do Direito deve ter amplo alcance e garantir plena segurança às relações
jurídicas no seio da sociedade, não devendo ser modificado, nem tampouco ter
interpretações ou concepções antagônicas dentro do ordenamento jurídico
brasileiro.
Não obstante à
unicidade do Direito como ciência social, para facilitar o seu estudo e a sua
compreensão, de forma pedagógica buscou-se dividi-lo em dois grandes blocos, o
Direito Público e o Direito Privado, estabelecendo, assim, a clássica dicotomia
do direito.
Esta dicotomia do
Direito, conforme leciona Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 26), tem sua
origem no Direito Romano, sendo encontrado no Digesto (Livro I, título I, §
2º), na lição do Jurisconsulto Ulpiano, que estabelecia “Direito público é o
que corresponde às coisas do Estado; direito privado, o que pertence à utilidade
das pessoas”.
O Direito Público,
então, consiste no bloco do Direito qual regula as relações em que o Estado é
parte, regendo sua organização e suas atividades, bem como sua interação com
outros Estados, ou com os particulares, procedendo em razão do seu poder
soberano, bem como atuando em prol da tutela do bem coletivo (DINIZ, 2008,
p.17).
Por sua vez, o Direito
Privado está a serviço da proteção do interesse particular, regulamentando as
relações jurídicas entre particulares, preservando o indivíduo em si, e diante
das suas inter-relações.
Apesar da clássica
distinção, atualmente tal dicotomia tem sido ferrenhamente criticada, sendo,
inclusive, concebida como superada, pois a complexidade das relações jurídicas
da atualidade e a interdisciplinaridade entre os ramos e sub-ramos do direito
moderno permitem a interseção constante entre os fundamentos que sustentam (ou
melhor, sustentavam) esta dicotomia, de modo que diante de muitas situações
tais valores se entrelaçam, permitindo uma simbiose entre ambos os blocos desta
clássica dicotomia.
REFERÊNCIAS
DINIZ,
Maria Helena. Curso de Direito Civil
Brasileiro. Teoria Geral do direito Civil. 25ª ed. São Paulo: Saraiva,
2008.
GONÇALVES,
Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro.
Parte Geral. 10ª ed.São Paulo: Saraiva, 2012.
MASCARO,
Alysson Leandro. Introdução ao estudo do
Direito. São Paulo: Atlas, 2014.
LEITURA
COMPLEMENTAR
DINIZ,
Maria Helena. Compêndio de Introdução ao
Estudo do Direito. São Paulo: Saraiva, 2013.
FERRAZ
JR. Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo
do Direito. São Paulo: Atlas, 2013.
NADER,
Paulo. Introdução ao Estudo do Direito.
São Paulo: Gen, Forense, 2013.
REALE,
Miguel. Lições Preliminares de Direito.
São Paulo, Saraiva, 2013.
[1] Clever Jatobá é Advogado e
Consultor Jurídico, Pós Graduado em Direito do Estado, bem como em Direito
Civil e do Consumidor (JusPodivm), Mestrando em Família na Sociedade
Contemporânea (UCSal), bem como, Aluno do Curso de Doutorado em Direito Civil
pela Universidad de Buenos Aires (UBA – Argentina). Professor de Direito Civil e IED da Faculdade Ruy Barbosa, onde é Advogado e Supervisor do Balcão de Justiça e Cidadania da Boca do Rio. Professor e Coordenador
do Curso de Direito da Faculdade APOIO UNIFASS (Lauro de Freitas-Ba). Membro do
IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família.
[2] Conforme leciona Maria Helena Diniz
(2008, p.4), “o termo ‘direito’ não é unívoco, e nem tampouco equívoco, mas
análogo, pois designa realidades conexas ou relacionadas entre si. Deveras,
esse vocábulo ora se aplica à ‘norma’, ora à ‘autorização ou permissão’ dada
pela norma de ter ou fazer o que ela proíbe, ora à ‘qualidade do justo’ etc.,
exigindo tantos conceitos quantas forem as realidades a que se refere.”
[3] MASCARO, Alysson Leandro. Introdução ao estudo do Direito. São Paulo: Atlas, 2014. P.191.
[3] MASCARO, Alysson Leandro. Introdução ao estudo do Direito. São Paulo: Atlas, 2014. P.191.
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