domingo, 25 de setembro de 2011

Imprensa, Violência e Exclusão Social


Por: Clever Jatobá.

Na contemporaneidade não se pode desprezar a força da mídia de massa na formação da opinião pública, bem como nas decisões políticas do país. Neste contexto, tem-se acompanhado um dos maiores fenômeno no jornalismo da atualidade, qual seja: o crescente número de programas de jornalismo policial sensacionalista.

Estes programas se destacam por explorar episódios da violência urbana e social onde, por sua vez, o apresentador âncora se destaca ao interpretar caricatamente um papel de "paladino justiceiro", que bota a boca no mundo e cobra das autoridades a selvageria do combate à criminalidade, escudado sob o véu dos anseios da sociedade que fica refém de tanta violência.

A atuação destes apresentadores são o ápice da aplicação da (in)justiça. Estes programas não atuam como mero instrumento de informação social, pois não se subsumem à tarefa de noticiar os sangrentos episódios da violência cotidiana. Em verdade, eles apresentam um processo célere e eficaz de coibição de condutas criminosas e aplicação efetiva do direito penal (sic), pois eles prendem, condenam e automaticamente sentenciam.

Tais programas televisivos da imprensa sensacionalista, em verdade, promovem um constante afronte à dignidade da pessoa humana, atentando cotidianamente contra os direitos da personalidade, vitimando a honra, a imagem, a intimidade e a privacidade daqueles que, excluídos socialmente, se encontram na criminalidade. Outrossim, a atuação desta linha de imprensa se sustenta com sangue e violência, mas não propõe uma solução concreta capaz de restabelecer a paz social, nem melhorar a qualidade de vida da sociedade.

O pior de tudo é que o Direito contemporâneo tem avançado no sentido da valorização da dignidade da pessoa, corolário básico dos Direitos Humanos e, no âmbito penal, têm-se com fruto de uma conquista histórica o direito fundamental à presunção de inocência, princípio estruturante de um Estado Democrático de Direito, que determina a necessidade do apreço dos fatos à luz do devido processo legal, garantindo ampla defesa e contraditório, para que seja possível uma eventual condenação.

Bem, uma coisa é certa: a violência social é um fato que cotidianamente nos grita aos olhos de toda a sociedade. Então, questiona-se: qual seria a solução para frear tamanha violência?

Para alguns, a solução estaria na postura mais combativa da atuação policial; outros apostam na maior severidade das sanções do direito penal e até na redução da maioridade criminal (sic). Por sua vez, a resposta estatal tem se concretizado diante da produção de leis que criminalizam novas condutas.

O curioso é que todas estas propostas que transitam na seara do Direito Penal estão embasadas no discurso vazio e imediatista, estruturado sem qualquer comprometimento social com uma solução plausível e eficaz.

O Direito Penal se edifica diante de dois pilares: a tipificação das condutas concebidas como crime e da sua correspondente sanção. As sanções penais, no plano teórico, teriam três finalidades: retributiva; punitiva e ressocializadora. Sua natureza retributiva tem como finalidade promover uma resposta à sociedade, devolvendo ao criminoso os efeitos do seu comportamento anti-social; assim, a pena assume sua feição punitiva, oferecendo ao criminoso um castigo, qual seja, a segregação da sua liberdade; pois bem, neste contexto, retira-se o criminoso do seio da sociedade para depois que o mesmo cumpra um período segregado, possa se promover sua reinserção no seio social, o que caracteriza sua função ressocializadora.

Ocorre que tal ramo do direito não tem apresentado eficácia, nem solução ao problema da violência social. A tipificação de novos ilícitos, o aumento das penas, ou a atenção à sanção penal não tem inibido a prática dos crimes, nem reduzido os índices de violência e de criminalidade.

Por sua vez, o investimento do Estado no aparato técnico, na qualificação da mão-de-obra, na melhoria da remuneração e no aparelhamento policial fica esquecido. A falta de presídios que acolham e preservem com o mínimo de dignidade o número crescente de criminosos, que lá se encontram por manterem condutas anti-sociáveis e violarem as regras do direito penal é flagrante.

Reitera-se então, o mesmo questionamento: qual seria a solução?

Ante tal situação percebe-se que o segredo não está na repressão à violência e criminalidade, mas, sim, na atuação preventiva, direcionada a alcançar a gênese do problema, evitando que tal situação se concretize.

A adoção de medidas punitivas e repressivas é um mal necessário, mas, deve ser enxergada como um remédio a uma enfermidade social. Assim, o mais coerente seria atuar preventivamente, buscando adotar medias de natureza social, que à longo prazo possa promover a melhor situação de vida de todos.

O problema da violência se concretiza em razão da má distribuição de rendas, da falta de emprego e oportunidades, onde famílias inteiras são largadas na miséria, sendo obrigadas a agasalharem-se sob marquises, bancos de praça, convivendo na sala de estar da exclusão social.

Assim sendo, independentemente da origem, ou das circunstâncias que os levaram à vida nas ruas, uma coisa é certa: o cenário de exclusão, os deixam à margem da sociedade, isentos das muitas oportunidades de alcançar um lugar no futuro, retirando e vitimando a própria dignidade.

Diante de tal cruel realidade, imperioso se faz ter uma atuação mais efetiva do Estado, com a implementação de políticas sociais mais eficazes na redução da desigualdade social e na promoção da redistribuição de rendas, permitindo, assim, restabelecer a dignidade dos excluídos e inseri-los no seio da sociedade, por meio do desfrute dos direitos básicos do ser humano: vida, saúde, educação, esporte, cultura, lazer, profissionalização e trabalho, moradia, segurança, saneamento básico e urbanização.

Os crescentes números da delinqüência infantojuvenil, bem como da criminalidade é reflexo direto do descaso da sociedade e do Estado com a realidade de abandono e exclusão social. Enquanto não se adotarem medidas de efetiva inclusão social dos marginalizados econômica, social e culturalmente, estaremos condenados a conviver com a violência, delinqüência e a criminalidade.

Na atualidade, faz-se necessário promover a conscientização da sociedade de que a redistribuição de rendas, os investimentos em educação, esporte, cultura, lazer, profissionalização e criação de novos empregos para permitir a inserção ou a reinserção das pessoas no mercado de trabalho é algo vital, e que o combate à desigualdade social, deságua inexoravelmente na redução da criminalidade.

Por tudo isso, nos cabe asseverar que, enquanto não adotarmos medidas sociais eficazes, estaremos condenados à liberdade da prisão domiciliar, pois precisaremos de grades, porteiros, câmeras de segurança, seguros patrimoniais para nos proteger de uma realidade que nosso silêncio nos impõe.

REFERÊNCIAS:
Imagem do excelente Filme nacional Tropa de Elite 2.

Clever Jatobá é Advogado e Consultor Jurídico. Especialista em Direito do Estado, bem como em Direito Civil e do Consumidor (JusPodivm e Faculdade Baiana de Direito), Doutorando em Direito Civil pela UBA - Universidad de Buenos Aires. Professor de Direito da Faculdade Maurício de Nassau (Salvador-Ba) e da Faculdade Apoio/Unifass (Lauro de Freitas-Ba). Ex professor e Coordenador do NPJ da FABAC (Lauro de Freitas-Ba), tendo lecionado também na UNIJORGE, UNIRB, além de professor do Curso Degrau preparatório para concurso.