quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

INTRODUÇÃO AO DIREITO DE FAMÍLIA

O CONCEITO DE FAMÍLIA
Prof. Clever Jatobá[1]

      1.      REDESENHANDO O CONCEITO DE FAMÍLIA

A família talvez seja o agrupamento social mais básico e mais importante da história da humanidade, todavia, seu conceito tem sofrido constantes alterações ao longo dos tempos, fato que impõe a necessidade de ser revisitado de tempos em tempos.

Etimologicamente, sustentam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2008, p.8), que a expressão tem origem na língua dos oscos, povo do norte da península italiana, como desdobramento da expressão famel, qual decorre da raiz latina famul, tendo com o significado a idéia de servos ou conjunto de escravos[2] pertencentes ao mesmo patrão[3].

Ao bem da verdade, o conceito de família ao longo da história sempre foi apreciado por vários prismas, dentre os quais, quatro deles vale à pena identificar, quais sejam: a) o prisma sociológico, b) o prisma religioso, c) o prisma econômico, e, por fim, d) o prisma jurídico.

A origem da sociedade decorre de um fenômeno natural, fundada na necessidade inerente à condição ontológica do “homem”[4], como ser social, de instintivamente constituir agrupamentos sociais com seus semelhantes para a satisfação das suas necessidades[5]. Uma vez que a família é o primeiro ambiente social no qual a pessoa se encontra inserida, neste contexto, sob o prisma sociológico, a mesma pode ser considerada um agrupamento natural básico e estrutural da sociedade.

Sob o prisma religioso[6] a família teve duas concepções ao longo da história, uma da antiguidade e outra, após o Cristianismo, sendo desenhado pelo catolicismo. Na antiguidade, havia a prática comum de se cultuar os antepassados como deuses domésticos, de modo que, neste contexto, a família era o “grupo de pessoas a quem a religião permitia invocar os mesmos manes e oferecer os banquetes fúnebres aos mesmos antepassados” (COULANGES, 2005, p.46)

Após o advento do Cristianismo, com a ascensão da Igreja Católica, buscou-se estruturar a família regulando o casamento como um instituto religioso, de modo a convertê-lo em um sacramento divino, constituído sob as bênçãos de Deus, fato que restringiu a noção de família aos moldes matrimoniais.

Não se pode desmerecer ainda, o fato da família já ter sido concebida como um núcleo doméstico de produção agrícola, bem como artesanal, voltada para a própria subsistência dos seus membros. Desta forma, desenha-se uma concepção familiar edificada sob o prisma econômico, onde a família chegou a ser considerada uma unidade de produção.

Neste sentido, inclusive, Maria Berenice Dias (2006, p.26) sustenta que:

A família tinha uma formação extensiva, verdadeira comunidade rural, integrada por todos os parentes, formando uma unidade de produção, com amplo incentivo à procriação. Sendo entidade patrimonializada, seus membros eram força de trabalho. O crescimento da família ensejava melhores condições de sobrevivência a todos.

Por fim, não obstante à todas estas concepções, a família recebeu um enfoque sob o prisma jurídico, pois o Direito, como instrumento de regulamentação da vida social, buscou regular a família desde sua constituição e dissolução, passando pelos seus vínculos e efeitos, tanto pessoais, quanto patrimoniais.

1.1. A FAMÍLIA EM SUA CONCEPÇÃO POPULAR

Apesar desta origem etimológica da expressão “família” e das demais concepções desenhadas ao longo da história da humanidade, quando se fala em “família”, no senso comum quatro outros prismas são levados em conta, quais sejam: a) o conjugal, b) o nuclear, c) a idéia de parentesco d) além do critério afetivo.

Assim, sob o prisma conjugal, família é o enlace matrimonial de duas pessoas. Já sob a ótica nuclear, trata-se do agrupamento que vincula as figuras de pai, da mãe e do filho. No que tange ao parentesco, a idéia de família abrange os parentes aos quais as pessoas estão vinculadas. Por fim, a evolução dos costumes alcança o aspecto afetivo, qual constitui a idéia de que a família é um agrupamento originado, mantido e norteado pelo afeto, sendo considerado o porto seguro da pessoa, um locus de acolhimento e proteção interpessoal no qual a pessoa desenvolve a sua personalidade. Este, a propósito, talvez seja a essência da concepção contemporânea da família.

  1. O DIREITO DE FAMÍLIA: CONCEITO E COMPREENSÃO

Sendo a família o primeiro ambiente social no qual a pessoa se encontra inserida, é natural que as relações interpessoais da sua constituição, dissolução, vínculos que dele decorram, além de seus efeitos, quando repercutam no ambiente jurídico sejam devidamente regulados pelo direito, haja visto o fato do direito ser o instrumento básico de regulamentação da vida social, assim, surge o Direito de Família.

Neste contexto, podemos dizer que o Direito de Família é o ramo do direito privado formado pelo conjunto de regras e princípios direcionados ao estudo das entidades familiares, promovendo a regulamentação das relações pessoais e patrimoniais instituídas desde a sua constituição à sua dissolução, contemplando em todos os momentos os seus efeitos jurídicos.

Destarte, como dissemos, cabe ao Direito de Família regulamentar como se constitui e como se dissolve a família, regulando as relações pessoais, dentre as quais podemos exemplificar, entre outros, a alteração do estado civil, os vínculos de parentesco, inclusive os de filiação. Por outro lado, no que tange às relações patrimoniais, cabe ainda ao Direito a missão de regulamentar o regime de bens e a eventual divisão do patrimônio em caso de dissolução, bem como a própria obrigação alimentar.

Ao bem da verdade, o Direito de Família tem um campo de regulação muito mais amplo do que o mencionado, qual se desenha cotidianamente, mas, a sua essência não se distancia da idéia da regulamentação das relações familiares.

BIBLIOGRAFIA

CASTRO, Flávia Lages de. História do Direito Geral e Brasil. 4 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.

COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. Jean Melville. São Paulo: Martin Claret, 2005.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria Geral do Estado. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito das Famílias.  Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

QUADRO SINÓPTICO
ESQUEMA DE AULA 01
                      
                       1)   CONCEITO DE FAMÍLIA
1.1-            Etimologicamente – Famullus - Familias
1.2-            Sob o prisma Sociológico 
1.3-            Sob o prisma Religioso
1.4-            Sob o prisma Econômico
1.5-            Sob o Prisma Jurídico

2)   A FAMÍLIA SOB O ENFOQUE POPULAR
2.1-            Sob o Prisma Conjugal – Enlace Matrimonial entre Casal
2.2-            Sob o Prisma  Nuclear – Pai, Mãe e Filho
2.3-            Sob o Prisma  Afetivo – Eudemonista

                 3)      DO DIREITO DE FAMÍLIA
           3.1-     Conceito
           3.2-     Compreensão




[1] Clever Jatobá é Advogado e Consultor Jurídico baiano, Pós Graduado em Direito do Estado pelo JusPodivm, Mestrando em Família na Sociedade Contemporânea pela UCSal, Aluno do Doutorado em Direito Civil pela UBA – Universidade de Buenos Aires – (Argentina). Professor e coordenador do Curso de Direito da Faculdade Apoio Unifass (Lauro de Freitas-Ba), bem como Professor de Direito da Faculdade Ruy Barbosa, onde também Advoga e Coordena o Balcão de Justiça e Cidadania da Boca do Rio. (E-mail: cleverjatoba@yahoo.com.br) 
[2] A propósito, tem-se, neste sentido, como referência o clássico episódio histórico da chegada da “Família Real” ao Brasil, onde se faz menção à chegada de Dom João VI, qual vinha ao país acompanhado não apenas da sua família nuclear, mas também de parentes e todos os servos que a ele estavam submetidos, de modo que a expressão “família” se apresenta clara perante este contexto da sua origem etimológica.
[3] No mesmo sentido, Flávia Lages de Castro (2007, p.98) arremata que a origem latina do termo família remonta a idéia de famulus, submetendo o conjunto de servos e dependentes a um chefe ou senhor, papel, este, representado pelo pater.
[4] A expressão “homem” encontra-se contextualizada no sentido abrangente de “ser humano”.
[5] Tal entendimento constitui a teoria naturalista, qual atesta o surgimento natural da sociedade. Segundo Dalmo de Abreu Dalari (2002, p.9-10) esta teoria é a mais aceita na atualidade, sendo, inclusive, amplamente defendida por Aristóteles, São Tomás de Aquino, Cícero, entre tantos outros.
[6]  Faz-se necessário sinalizaer que desde o início dos tempos, sempre foram fortes as influências religiosas na vida da humanidade, por isso, as mesmas sempre repercutiram diante da concepção e regulamentação moral da família.

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