Prof.
Clever Jatobá[1]
1. REDESENHANDO O CONCEITO DE FAMÍLIA
A família talvez seja o
agrupamento social mais básico e mais importante da história da humanidade,
todavia, seu conceito tem sofrido constantes alterações ao longo dos tempos, fato
que impõe a necessidade de ser revisitado de tempos em tempos.
Etimologicamente, sustentam
Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2008, p.8), que a expressão tem
origem na língua dos oscos, povo do norte da península italiana, como
desdobramento da expressão famel, qual
decorre da raiz latina famul, tendo
com o significado a idéia de servos ou conjunto de escravos[2]
pertencentes ao mesmo patrão[3].
Ao bem da verdade, o
conceito de família ao longo da história sempre foi apreciado por vários
prismas, dentre os quais, quatro deles vale à pena identificar, quais sejam: a)
o prisma sociológico, b) o prisma religioso, c) o prisma econômico, e, por fim,
d) o prisma jurídico.
A origem da sociedade
decorre de um fenômeno natural, fundada na necessidade inerente à condição
ontológica do “homem”[4],
como ser social, de instintivamente constituir agrupamentos sociais com seus
semelhantes para a satisfação das suas necessidades[5].
Uma vez que a família é o primeiro ambiente social no qual a pessoa se encontra
inserida, neste contexto, sob o prisma sociológico, a mesma pode ser
considerada um agrupamento natural básico e estrutural da sociedade.
Sob o prisma religioso[6]
a família teve duas concepções ao longo da história, uma da antiguidade e outra,
após o Cristianismo, sendo desenhado pelo catolicismo. Na antiguidade, havia a
prática comum de se cultuar os antepassados como deuses domésticos, de modo
que, neste contexto, a família era o “grupo de pessoas a quem a religião
permitia invocar os mesmos manes e oferecer os banquetes fúnebres aos mesmos
antepassados” (COULANGES, 2005, p.46)
Após o advento do
Cristianismo, com a ascensão da Igreja Católica, buscou-se estruturar a família
regulando o casamento como um instituto religioso, de modo a convertê-lo em um
sacramento divino, constituído sob as bênçãos de Deus, fato que restringiu a
noção de família aos moldes matrimoniais.
Não se pode desmerecer
ainda, o fato da família já ter sido concebida como um núcleo doméstico de
produção agrícola, bem como artesanal, voltada para a própria subsistência dos
seus membros. Desta forma, desenha-se uma concepção familiar edificada sob o
prisma econômico, onde a família chegou a ser considerada uma unidade de
produção.
Neste sentido,
inclusive, Maria Berenice Dias (2006, p.26) sustenta que:
A
família tinha uma formação extensiva, verdadeira comunidade rural, integrada
por todos os parentes, formando uma unidade de produção, com amplo incentivo à
procriação. Sendo entidade patrimonializada, seus membros eram força de
trabalho. O crescimento da família ensejava melhores condições de sobrevivência
a todos.
Por fim, não obstante à
todas estas concepções, a família recebeu um enfoque sob o prisma jurídico,
pois o Direito, como instrumento de regulamentação da vida social, buscou regular
a família desde sua constituição e dissolução, passando pelos seus vínculos e efeitos,
tanto pessoais, quanto patrimoniais.
1.1. A FAMÍLIA EM SUA CONCEPÇÃO POPULAR
Apesar desta origem
etimológica da expressão “família” e das demais concepções desenhadas ao longo
da história da humanidade, quando se fala em “família”, no senso comum quatro
outros prismas são levados em conta, quais sejam: a) o conjugal, b) o nuclear, c)
a idéia de parentesco d) além do critério afetivo.
Assim, sob o prisma
conjugal, família é o enlace matrimonial de duas pessoas. Já sob a ótica
nuclear, trata-se do agrupamento que vincula as figuras de pai, da mãe e do
filho. No que tange ao parentesco, a idéia de família abrange os parentes aos
quais as pessoas estão vinculadas. Por fim, a evolução dos costumes alcança o
aspecto afetivo, qual constitui a idéia de que a família é um agrupamento
originado, mantido e norteado pelo afeto, sendo considerado o porto seguro da
pessoa, um locus de acolhimento e proteção
interpessoal no qual a pessoa desenvolve a sua personalidade. Este, a
propósito, talvez seja a essência da concepção contemporânea da família.
- O DIREITO DE
FAMÍLIA: CONCEITO E COMPREENSÃO
Sendo a família o
primeiro ambiente social no qual a pessoa se encontra inserida, é natural que
as relações interpessoais da sua constituição, dissolução, vínculos que dele
decorram, além de seus efeitos, quando repercutam no ambiente jurídico sejam
devidamente regulados pelo direito, haja visto o fato do direito ser o
instrumento básico de regulamentação da vida social, assim, surge o Direito de
Família.
Neste contexto, podemos
dizer que o Direito de Família é o ramo do direito privado formado pelo
conjunto de regras e princípios direcionados ao estudo das entidades
familiares, promovendo a regulamentação das relações pessoais e patrimoniais
instituídas desde a sua constituição à sua dissolução, contemplando em todos os
momentos os seus efeitos jurídicos.
Destarte, como dissemos,
cabe ao Direito de Família regulamentar como se constitui e como se dissolve a
família, regulando as relações pessoais, dentre as quais podemos exemplificar,
entre outros, a alteração do estado civil, os vínculos de parentesco, inclusive
os de filiação. Por outro lado, no que tange às relações patrimoniais, cabe
ainda ao Direito a missão de regulamentar o regime de bens e a eventual divisão
do patrimônio em caso de dissolução, bem como a própria obrigação alimentar.
Ao bem da verdade, o
Direito de Família tem um campo de regulação muito mais amplo do que o
mencionado, qual se desenha cotidianamente, mas, a sua essência não se
distancia da idéia da regulamentação das relações familiares.
BIBLIOGRAFIA
CASTRO, Flávia Lages de. História do Direito Geral e Brasil. 4
ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. Jean Melville. São
Paulo: Martin Claret, 2005.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da Teoria Geral do Estado. 20
ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
DIAS, Maria Berenice. Manual
de Direito das Família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
FARIAS,
Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson.
Direito das Famílias. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008.
QUADRO
SINÓPTICO
ESQUEMA
DE AULA 01
1) CONCEITO DE FAMÍLIA
1.1-
Etimologicamente – Famullus - Familias
1.2- Sob o prisma Sociológico
1.3- Sob o prisma Religioso
1.4-
Sob o prisma Econômico
1.5- Sob o Prisma Jurídico
2) A FAMÍLIA SOB O ENFOQUE POPULAR
2.1-
Sob o Prisma Conjugal – Enlace Matrimonial entre Casal
2.2-
Sob o Prisma Nuclear – Pai, Mãe e Filho
2.3-
Sob o Prisma Afetivo – Eudemonista
3)
DO DIREITO DE FAMÍLIA
3.1-
Conceito
3.2-
Compreensão
[1] Clever Jatobá é Advogado e
Consultor Jurídico baiano, Pós Graduado em Direito do Estado pelo JusPodivm,
Mestrando em Família na Sociedade Contemporânea pela UCSal, Aluno do Doutorado
em Direito Civil pela UBA – Universidade de Buenos Aires – (Argentina).
Professor e coordenador do Curso de Direito da Faculdade Apoio Unifass (Lauro
de Freitas-Ba), bem como Professor de Direito da Faculdade Ruy Barbosa, onde
também Advoga e Coordena o Balcão de Justiça e Cidadania da Boca do Rio. (E-mail: cleverjatoba@yahoo.com.br)
[2] A propósito, tem-se, neste
sentido, como referência o clássico episódio histórico da chegada da “Família
Real” ao Brasil, onde se faz menção à chegada de Dom João VI, qual vinha ao
país acompanhado não apenas da sua família nuclear, mas também de parentes e
todos os servos que a ele estavam submetidos, de modo que a expressão “família”
se apresenta clara perante este contexto da sua origem etimológica.
[3] No mesmo sentido, Flávia Lages
de Castro (2007, p.98) arremata que a origem latina do termo família remonta a
idéia de famulus, submetendo o
conjunto de servos e dependentes a um chefe ou senhor, papel, este,
representado pelo pater.
[4] A expressão “homem”
encontra-se contextualizada no sentido abrangente de “ser humano”.
[5] Tal entendimento constitui a
teoria naturalista, qual atesta o surgimento natural da sociedade. Segundo
Dalmo de Abreu Dalari (2002, p.9-10) esta
teoria é a mais aceita na atualidade, sendo, inclusive, amplamente defendida
por Aristóteles, São Tomás de Aquino, Cícero, entre tantos outros.
[6] Faz-se necessário sinalizaer que desde o
início dos tempos, sempre foram fortes as influências religiosas na vida da
humanidade, por isso, as mesmas sempre repercutiram diante da concepção e
regulamentação moral da família.
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